O presidente Luiz Inácio Lula da Silva fez forte declaração nesta terça-feira (4/11) ao criticar a megaoperação policial realizada nos complexos da Complexo do Alemão e da Complexo da Penha, na zona norte do Rio de Janeiro, que resultou na morte de 121 pessoas, segundo dados divulgados pelo governo estadual.
Lula afirmou que “a ordem do juiz era uma ordem de prisão, não para uma matança — e, no entanto, houve uma matança”. Ele considerou que, embora alguns possam ver o elevado número de mortes como um “sucesso” da ação policial, do ponto de vista da atuação do Estado o resultado foi “desastroso”.
Na entrevista concedida à imprensa internacional em Belém (PA), o presidente defendeu que seja conduzida uma investigação independente para apurar todas as circunstâncias da operação. “É importante ver em que condições ela se deu… houve uma matança”, disse ele.
Segundo ele, o fato de tantas pessoas terem morrido em uma ação cujo objetivo declarado era o cumprimento de mandados de prisão revela falhas graves no planejamento ou na execução da operação.
A ação policial foi descrita pelo governo fluminense como “a mais letal da história” do estado e teve como alvo principal a facção Comando Vermelho. Lula criticou ainda o risco de que o modelo de segurança público predominante — inteiramente baseado em confronto armado — agrave a vulnerabilidade de comunidades e a confiança da população no Estado. Ele ressaltou que o combate ao crime organizado deve ter como princípio a proteção da vida humana e o respeito aos direitos fundamentais.
O pronunciamento repercutiu com intensidade no cenário político. Diversas entidades de direitos humanos e organizações da sociedade civil já vinham reclamando de “letalidade excessiva” nas intervenções policiais em favelas. O presidente se posicionou alinhado com esse debate, lembrando que “não podemos aceitar que o crime organizado continue destruindo famílias, oprimindo moradores e espalhando violência… mas isso não justifica matarem sem atender aos requisitos legais”.
Por sua vez, o governo do Estado do Rio de Janeiro defendeu a operação, afirmando que o nível de força empregado foi proporcional à gravidade da ameaça enfrentada. Entretanto, o pronunciamento de Lula coloca pressão para que as autoridades apresentem com mais transparência laudos periciais, nomes das vítimas, itinerários operacionais e protocolos usados na ação.
Para especialistas em segurança pública, o que está em jogo é mais amplo do que a letalidade de uma operação: trata-se de compreender se o Estado consegue garantir segurança com justiça, equilíbrio e proteção de comunidades vulneráveis. A fala do presidente Lula, por descrever a ação como “matança”, amplia o debate sobre os limites do uso da força estatal em áreas de conflito urbano.
Apesar das declarações, ainda não está claro se a investigação federal terá acesso irrestrito a todos os documentos da operação ou se haverá responsabilizações. O governo federal indicou que acompanhará o processo para assegurar “que todos os óbitos e circunstâncias sejam examinados com rigor”.