A Câmara dos Deputados aprovou, na madrugada desta quarta feira, o projeto conhecido como PL da dosimetria, que reduz as penas dos condenados pelos atos de 8 de janeiro de 2023 e pela tentativa de golpe de Estado. O texto passou pelo plenário por 291 votos a 148 e agora segue para análise do Senado.
O projeto aprovado é um substitutivo do deputado Paulinho da Força, do Solidariedade de São Paulo, ao PL 2162 de 2023, de autoria de Marcelo Crivella e outros parlamentares. A versão original previa uma anistia ampla aos investigados e condenados, mas esse ponto foi retirado após resistência de parte da Câmara e da opinião pública. A alternativa construída foi a revisão das regras de cálculo das penas, mantendo condenações, porém com redução do tempo de prisão.
O ponto central do texto determina que, quando os crimes de tentativa de abolir o Estado Democrático de Direito e de tentativa de golpe de Estado forem cometidos no mesmo contexto, não haverá mais soma das penas. Nessa situação, passa a valer apenas a pena mais grave, de tentativa de golpe, que vai de quatro a doze anos de prisão. Hoje, as duas penas são somadas, o que elevou as condenações de Jair Bolsonaro e de aliados militares para faixas entre dezesseis e vinte e quatro anos de reclusão.
Como a lei penal pode retroagir para beneficiar o réu, a mudança abre caminho para revisão das sentenças já impostas pelo Supremo Tribunal Federal. Cálculos apresentados por parlamentares da oposição indicam que, no caso de Jair Bolsonaro, o tempo em regime fechado poderia cair de sete anos e oito meses para algo em torno de dois anos e quatro meses, antes de eventual progressão. A palavra final sobre os novos cálculos continuará sendo do STF e da Vara de Execuções Penais.
O projeto também mexe diretamente na Lei de Execução Penal. Hoje, para crimes cometidos com violência ou grave ameaça, a progressão do regime fechado para o semiaberto exige o cumprimento de 25% da pena para réus primários e 30% para reincidentes. Pelo texto aprovado, a regra geral passa a ser de 16% para primários e 20% para reincidentes, exceto em crimes hediondos. Com isso, condenados pelos crimes ligados ao 8 de janeiro poderão deixar o regime fechado mais cedo.
Outra mudança prevê redução de um terço a dois terços da pena para quem foi condenado por tentativa de golpe ou de abolição do Estado Democrático de Direito no contexto de multidão, como os manifestantes que participaram das invasões às sedes dos Três Poderes, desde que o condenado não tenha financiado o ato nem exercido liderança.
A sessão que aprovou o projeto ocorreu depois de um dia tenso na Câmara. Horas antes, o deputado Glauber Braga, do PSOL do Rio de Janeiro, havia sido retirado à força da Mesa Diretora pela Polícia Legislativa, após anunciar que ocuparia a cadeira da presidência em protesto contra o andamento de seu processo de cassação. Durante a confusão, as transmissões oficiais da Casa foram interrompidas e jornalistas foram impedidos de entrar no plenário. A votação do PL da dosimetria só foi retomada à noite, sob clima de protesto da oposição de esquerda.
No plenário, partidos ligados à direita e ao centrão orientaram voto a favor do texto e trataram a aprovação como vitória política, argumentando que as penas fixadas pelo STF foram excessivas e desproporcionais. Já PT, PSOL, Rede e setores da base governista votaram contra e apresentaram seis destaques para tentar derrubar trechos que reduziam o tempo de prisão e ampliavam a progressão de regime. Todos os destaques foram rejeitados.
Após a votação, o presidente da Câmara, Hugo Motta, declarou que considera os atos de 8 de janeiro graves, mas afirmou que o texto é resultado de uma “construção política” que, segundo ele, busca pacificar o país. No Senado, o presidente Davi Alcolumbre já adiantou em plenário que pretende pautar o projeto ainda em 2025, caso ele chegue a tempo, o que mantém o tema no centro das negociações entre governo e oposição nas próximas semanas.